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Se eu não a tenho, ela me tem


Arnaut Daniel (tradução-recriação de Augusto de Campos)

Se eu não a tenho, ela me tem
o tempo todo preso, Amor,
e tolo e sábio, alegre e triste,
eu sofro e não dou o troco.
É indefeso quem ama.
Amor comanda
à escravidão mais branda
e assim me rendo,
sofrendo,
à dura lida
que me é deferida.

Se calo, é porque mais convém
calar, em mim, o meu calor.
A língua hesita, o corpo existe
e, doendo, acha pouco,
sofre mas não reclama.
A sombra vã da
memória me demanda
e eu me surpreendo
mexendo
nesta ferida
sempre revolvida.

CAMPOS, Augusto de. Mais provençais – Amaut Doniel/Raimbaut D’Aurenga. São Paulo: Companhia das letras. 1987. p.79.

Arnaut Daniel

Arnaut Daniel


Arnaut Daniel de Ribérac nasceu em Périgord, na atual França, por volta de 1150 ou 1160. Foi um dos principais representantes do estilo de poesia trovadoresca trobar clus. Foram conservadas 18 composições suas, duas delas com música, tratando quase sempre de temas amorosos. É considerado o criador da sextina, uma canção com estrofes de seis versos. No século XX, o interesse por sua obra foi retomado, o que repercutiu no Brasil por meio dos ensaios e das traduções de Augusto de Campos.

Augusto De Campos

Augusto de Campos



Augusto Luís Browne de Campos, poeta, tradutor e ensaísta nascido em São Paulo em 1931, é um dos criadores do movimento concretista no Brasil, com seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari. Em 1952, eles lançaram a revista Noigandres, palavra retirada de uma cantiga de Arnaut Daniel que significa “perfume para afugentar o tédio” É autor de estudos e traduções da poesia provençal no Brasil. Sua obra crítica é composta de Teoria da poesia concreta, O anticrítico e outros. Traduziu autores importantes corno Mallarmé, Joyce, Maiakóvski, Raimbaut D’Aurenga e Arnaut Daniel.